EXPANSÃO PUNITIVA E “APERTAR DO CERCO" ÀS "ENTIDADES OBRIGADAS" NOS TERMOS DA LEI N.º 83/2017, DE 18 DE AGOSTO
A Lei n.º 58/2020, de 31 de agosto – que transpôs para o ordenamento nacional a Diretiva (UE) 2018/843 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2018 e a Diretiva (UE) 2018/1673 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2018 –, além de alterar a regulação da prevenção do branqueamento, procedeu igualmente a alterações no que respeita à sua repressão, concretamente ao crime de branqueamento do artigo 368.º-A do Código Penal.
A novidade mais visível incide na ampliação do catálogo de crimes precedentes, isto é, dos ilícitos geradores de vantagens cujo branqueamento é (também) sucessivamente punível.
A redação anteriormente em vigor do crime de branqueamento considerava passíveis de punição as vantagens provenientes de um conjunto de crimes que resultavam, por um lado, de um elenco taxativo incluído no texto do artigo 368.º-A, e, por outro lado, de um critério baseado na gravidade do crime precedente (com «pena de prisão de duração mínima superior a seis meses ou de duração máxima superior a cinco anos»).
A nova redação resultante da Lei n.º 58/2020, de 31 de agosto, já em vigor, optou por manter o critério de gravidade, mas alargou significativamente o catálogo de crimes precedentes expressamente previstos. Além dos factos ilícitos típicos anteriormente abrangidos, esta nova Lei veio acrescentar a punição do branqueamento de vantagens obtidas, entre outros, com a prática dos crimes de abuso de cartão de garantia ou de crédito, falsidade informática, dano relativo a programas ou outros dados informáticos, sabotagem informática, acesso ilegítimo, burla informática, extorsão, auxílio à imigração, danos contra a natureza, poluição, fraude fiscal contra a segurança social, recebimento indevido de vantagem, manipulação de mercado, abuso de informação, violação do exclusivo da patente, violação dos direitos exclusivos relativos a desenhos ou modelos, contrafação, imitação e uso ilegal de marca, venda ou ocultação de produtos e fraude sobre mercadorias.
Paralelamente, a nova redação do artigo 368.º-A do Código Penal acolheu uma agravação em um terço da pena aplicável ao crime de branqueamento quando o agente praticar de forma habitual atos de branqueamento («converter, transferir, auxiliar ou facilitar alguma operação de conversão ou transferência de vantagens») e quanto o comportamento em causa tiver sido levado a cabo por uma entidade obrigada – financeira ou não-financeira – nos termos da Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto, na versão em vigor. Com esta novidade legislativa, estes agentes e entidades passam a incorrer numa pena agravada pela prática de crime de branqueamento que pode ir até à duração máxima de 16 anos de prisão.
Por um lado, estas alterações vão ao encontro de uma tendência internacional de expansão das fronteiras punitivas do crime de branqueamento através do alargamento das condutas antecedentes – tendência que, por exemplo, na Alemanha, recentemente lançou a discussão parlamentar com vista à inclusão de todos os crimes do ordenamento jurídico como possíveis factos precedentes do crime de branqueamento.
Por outro lado, os agravamentos da pena acima mencionados revelam um propósito de articulação entre as finalidades preventivas e repressivas do branqueamento, sujeitando-se agora os “gate-keepers” do sistema financeiro, já sujeitos a deveres preventivos, também a uma responsabilidade criminal agravada.