1.A sucessão testamentária constitui reflexo direto da autonomia da vontade, na medida em que possibilita, em vida, que a pessoa determine a forma como serão partilhados todos os seus bens após sua morte. O Código Civil exige, no entanto, que havendo herdeiros necessários (pais, avós, filhos, netos e cônjuge/companheiro), deverá ser respeitada a legítima, ou seja, a metade dos bens do testador não poderá ser objeto de testamento. Inexistindo herdeiros necessários, é possível a disposição total dos bens, elegendo o testador aquele que lhe convier.

2. A problemática ocorre, no entanto, com a morte de um dos herdeiros testamentários antes mesmo da abertura da sucessão, sem que exista, no testamento, a indicação de seu substituto. Nesse caso, como se dará a partilha da cota testamentária sem herdeiro?

3. Essa hipótese foi tratada no Recurso Especial n° 1674162, julgado em outubro de 2018 pelo Superior Tribunal de Justiça, em que a instituidora da herança, solteira, sem filhos e sem herdeiros ascendentes, portanto sem herdeiros necessários, deixou todos seus bens aos sobrinhos, o que motivou o pedido de irmão da falecida para acrescer à cota testamentária sem herdeiro.

4. Tratando-se de cota testamentária, não ocorre o chamado direito de representação do herdeiro pré-morto, de modo que, inexistindo indicação de substituto, sua cota retorna ao espólio e não é automaticamente transferida aos herdeiros do pré-morto. Além disso, conforme decidiu o STJ, a cota testamentária remanescente deverá ser partilhada, igualmente, entre os herdeiros legítimos, na ordem da vocação hereditária estabelecida no artigo 1.829 do Código Civil, aí sim incluindo o irmão da falecida, que deverá partilhar referida cota com os sobrinhos, que figurarão, neste ponto específico, como herdeiros legítimos por estirpe.

5. Com esse raciocínio, o STJ entendeu que não é possível ao irmão acrescer toda a cota testamentária remanescente que ficou sem herdeiro, de modo que não lhe toca o direito de acrescer previsto no artigo 1.941 do Código Civil. Ao irmão, a quem a lei conferiu a qualidade de herdeiro legítimo, mas não de herdeiro necessário (artigo 1.845 do Código Civil), caberá parte da cota testamentária sem dono, que será partilhada com os sobrinhos já contemplados pelo testamento, que, aí sim, figuram também como herdeiros legítimos em representação do ascendente pré-morto, irmãos da falecida.

6. Com essa decisão, a Corte Superior esclarece a quem compete o direito de acrescer e os limites que a lei impõe, a fim de garantir a prevalência da vontade do testador.

Íntegra do acórdão disponível em:

https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1762669&num_registro=201701216511&data=20181026&formato=PDF