A Lei nº 13.506, de 13 de novembro de 2017 (“Lei nº 13.506/17”), entrou em vigor em 14 de novembro de 2017, alterando significativamente os processos administrativos sancionadores instaurados pela Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) e pelo Banco Central do Brasil (“Bacen”), promovendo alterações em diversos dispositivos legais, dentre eles, a Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976 (“Lei nº 6.385/76”).
A Lei nº 13.506/17 decorre do Projeto de Lei nº 8.843/17, abordado em nosso Informativo de Mercado de Capitais, de 25 de outubro de 2017 (que tratou também, da perda de validade da MP 784/17). Para ter acesso a tal informativo, clique aqui.
Consideradas as mudanças de ordem material e processual de grande relevância à regulação do mercado de capitais brasileiro, segue abaixo sintética contribuição deste escritório.
A incidência da Lei 13.506/17
As alterações promovidas sobre ilícitos, sanções e penalidades pela Lei nº 13.506/17 passam a viger a partir de sua publicação, incidindo, portanto, sobre condutas praticadas a partir de 14 de novembro de 2017, salvo se, mesmo para os processos em trâmite, a nova redação revelar-se mais benéfica ao acusado.
Por sua vez, regras procedimentais, salvo eventual regulamentação distinta da CVM, passam a incidir imediatamente sobre os processos instaurados, vedada a retroatividade de lei.
Cabe ressaltar que alguns normativos da CVM, em especial a Deliberação CVM nº 538 de 5 de março de 2008, conforme alterada, sofrerão ajustes para compatibilizar os procedimentos neles previstos com as mudanças trazidas pela Lei nº 13.506/17.
Multas e cumulação das penalidades
A principal alteração promovida pela Lei nº 13.506/17 diz respeito às sanções passíveis de aplicação nos processos administrativos sancionadores conduzidos pela CVM. Além de prever a possibilidade de cumulação das penalidades, os valores de multa foram aumentados para: (i) R$ 50 milhões1 ; (ii) o dobro do valor da emissão ou da operação irregular2; (iii) 3 vezes o montante ou a vantagem econômica obtida ou da perda evitada; ou (iv) o dobro do prejuízo causado aos investidores. Cabe ressaltar que, nos casos de reincidência, os valores acima mencionados poderão ser elevados em até 3 vezes.
Vale destacar que o valor da multa cominatória aplicada pela inexecução de ordens da CVM também foi aumentado, não podendo exceder, por dia de descumprimento, o maior valor entre: (i) um milésimo do valor do faturamento total individual ou consolidado do grupo econômico, obtido no exercício anterior à aplicação da multa; ou (ii) R$ 100 mil3.
Penalidades restritivas de direito
Temos novidades no rol das penalidades restritivas de direitos (que, inclusive, já estavam previstas na MP 784/17). Adicionalmente às penalidades anteriores, foi autorizada a aplicação pela CVM de sanções como: (i) a proibição de contratar com instituições financeiras oficiais pelo período de até 5 anos; e (ii) a proibição de participar de licitações com as administrações públicas federal, estadual, distrital e municipal e entidades da administração pública indireta que tenham por objeto aquisições, alienações, realizações de obras e serviços e concessões de serviços públicos.
Ademais, foi alterada a sistemática de contagem do prazo para cumprimento da penalidade de inabilitação temporária, já prevista na redação antiga da Lei nº 6.385/76. Nos termos da nova legislação, este prazo passará a ser contado a partir da data em que a CVM receber, do inabilitado ou de cada entidade em que ele atuou como administrador ou conselheiro fiscal, a comunicação comprovada de que houve o efetivo afastamento. No mais, tal prazo poderá ser suspenso sempre que houver desrespeito aos termos da decisão de condenação.
Previsão da não instauração de Processo Administrativo Sancionador para Ilícitos de Pouca Relevância
Em contrapartida às alterações acima, a CVM poderá deixar de instaurar um processo administrativo sancionador nos casos em que considerar a pouca relevância da conduta, a baixa expressividade da lesão ao bem jurídico tutelado e a utilização de outros instrumentos e medidas de supervisão que julgar mais efetivos. Trata-se de avanço na legislação perante infrações de menor potencial ofensivo.
Recursos administrativos
Os recursos para o Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, nos termos do §4º do artigo 11 da Lei 6.385/76, passarão a ter, por regra, efeito devolutivo e suspensivo quando propostos em face de decisão que tenha imputado penalidades de multa ou advertência. Os demais recursos, propostos em face de penalidades diversas das mencionadas, terão apenas efeito devolutivo, sendo facultada a concessão de efeito suspensivo pela CVM mediante requerimento do interessado.
Acordos Administrativos em Processo de Revisão
A Lei nº 13.506/17 disciplina, ainda, os chamados “acordos administrativos em processos de supervisão”. Estes acordos poderão ser celebrados tanto pela CVM quanto pelo Bacen, desde que demonstrada a efetiva, plena e permanente cooperação dos acusados para a apuração dos fatos, considerada a efetiva utilidade para o processo, em especial mediante a identificação dos demais envolvidos e a obtenção de informações e documentos comprobatórios da infração ou investigação apurada.
O acordo poderá ser celebrado por pessoas físicas ou jurídicas que confessarem a prática do ilícito, tendo por consequência a diminuição das penalidades aplicáveis, de 1/3 a 2/3, ou até mesmo a total extinção da ação punitiva. Em caso de descumprimento do acordo, os acusados não poderão celebrar novo acordo pelo período de 3 anos, contados da data do conhecimento do descumprimento pelo órgão regulador.
O “acordo administrativo em processo de supervisão” se tornará público quando celebrado. Contudo, as propostas de acordo que forem rejeitadas não serão divulgadas e não resultarão na confissão do acusado e nem no reconhecimento da ilicitude.
Crimes contra o mercado de capitais
Em relação aos crimes contra o mercado de capitais, a Lei nº 13.506/17 simplificou a redação da Lei nº 6.385/76 sobre o crime de manipulação de mercado, praticado quanto houver a realização de operações simuladas ou manobras fraudulentas com o objetivo de elevar, manter ou baixar a cotação, o preço ou o volume negociado de um valor mobiliário, com a intenção de obter vantagem indevida.
Além disso, a Lei nº 13.506/17 passou a considerar como insider trading, em adição às hipóteses já existentes no sistema jurídico brasileiro, as operações realizadas por indivíduo que não tenha a obrigação de manter sigilo da informação relevante. Assim, a negociação por pessoa que tenha a obrigação de sigilo de informação relevante passou a ser considerada agravante da pena, que pode ser aumentada em até 1/3.
Citação e intimação
A citação e intimação dos acusados poderão ser realizadas por ciência no processo, via postal ou por meio eletrônico (sendo que, no caso da intimação, ela poderá ser realizada mediante disponibilização no site da CVM).
Quando ignorado, incerto ou inacessível o lugar em que se encontrar o acusado, ou em caso de esquiva, a citação será efetuada por meio de publicação no DOU ou no site da CVM.
A citação será considerada efetuada na data: (i) da ciência do acusado ou de procurador por ele constituído; (ii) da entrega no endereço do destinatário; (iii) do acesso ao sistema eletrônico da CVM; (iv) em que for atestada a recusa; ou (v) da publicação do edital no DOU ou no site da CVM.
Considera-se efetuada a citação no 6º dia subsequente ao da disponibilização do ato no sistema eletrônico da CVM caso o interessado não o acesse no referido prazo.
Importante lembrar que a Lei nº 13.506/17, além de versar sobre os processos administrativos sancionadores na CVM, regulamenta procedimentos similares na esfera do Bacen, que será abordado em informativo específico oportunamente. Para ter acesso à Lei nº 13.506/17, clique aqui.