A edição extra do Diário Oficial da União desta segunda-feira, dia 30 de outubro, tornou pública a edição da Medida Provisória nº 806 ("MP 806"), concretizando as especulações que há meses vinham crescendo no mercado quanto à introdução de substancial modificação na sistemática de tributação dos fundos de investimento em geral.

1. Novo sistema para tributação dos fundos fechados

A MP prevê tributação regressiva pelo IRRF com base no prazo do investimento nos últimos dias úteis de maio e novembro ou no momento da amortização ou resgate (em razão do término do prazo de duração do fundo), se ocorridos antes destas datas. As alíquotas aplicáveis são as regressivas de 22,5% a 15% (se o fundo for caracterizado como longo prazo) ou de 22,5% a 20% (se for curto prazo).

Pontos de atenção

  • Diferença em relação ao come-cotas aplicável aos fundos abertos: o sistema de tributação não é exatamente o mesmo sistema de come-cotas aplicável aos fundos abertos, como antes noticiado. No sistema de come-cotas aplicável aos fundos abertos, o tributo é antecipado nas menores alíquotas de 15% (para fundo de longo prazo) e de 20% (para fundos de curto prazo) e a tributação antecipada é posteriormente complementada por ocasião da amortização ou resgate. A regra da MP 806 traz um come-cotas com uma tributação regressiva definitiva às alíquotas aplicáveis com base no prazo de manutenção do investimento, colocando os cotistas de fundos fechados em situação potencialmente mais onerosa comparativamente aos cotistas de fundos abertos.
  • Fundos ilíquidos: adicionalmente pode haver dificuldades operacionais em relação aos fundos de ativos ilíquidos sujeitos à regra, pois o administrador não terá acesso ao caixa necessário para o recolhimento do tributo.

1.1. Tributação do estoque

A despeito de eventuais discussões que possam ser levantadas sobre o tema, a MP 806 prevê que a diferença entre custo de aquisição e o valor patrimonial da cota em 31 de maio de 2018 será tributada de acordo com a nova regra pelas mesmas alíquotas indicadas acima, atingindo, portanto, os ganhos até então acumulados e com tributação diferida.

1.2. Fundos excetuados da regra

Os cotistas dos seguintes fundos de investimento não estão sujeitos ao regime tributário indicado acima: FII, FIDC, FIC-FIDC, FIC-FIA, fundos que serão encerrados impreterivelmente até 31 de dezembro de 2018, FIP classificados como entidades de investimento, FIP não classificados como entidades de investimento e fundos exclusivos de não residentes.

Há uma assimetria nesta última hipótese: não residentes que investem em fundos abertos não estão sujeitos ao come-cotas e, portanto, não há razão lógica para estarem sujeitos a um tratamento mais oneroso quando investem em fundos fechados não exclusivos.

2. Novas regras para a tributação dos FIP

2.1. Fundos patrimoniais

Os fundos classificados como fundos patrimoniais (não entidade de investimento) passam a ser tributados como pessoas jurídicas. Estarão sujeitos à tributação de IRPJ e CSLL, bem como potencialmente a PIS/Cofins, quando aplicável. A regra não deixa claro se o fundo, equiparado a pessoa jurídica, após tributar seus resultados, poderá distribuir proventos como "dividendos" isentos ao cotista, o que pode colocar o cotista em uma situação mais onerosa da que estaria se investisse diretamente na pessoa jurídica investida pelo FIP.

Tributação do estoque: os rendimentos e ganhos diferidos nas carteiras dos fundos patrimoniais serão considerados pagos ou creditados aos cotistas no dia 2 de janeiro de 2018 sendo devido o IRRF independentemente de amortização/resgate. Há de se notar a potencial falta de liquidez para administrador do fundo recolher o IRRF no caso de valorização que não seja refletida em liquidez no fundo.

2.2. Fundos entidade de investimentos

Os fundos classificados como entidades de investimento continuam sujeitos às regras atuais com algumas modificações, dentre as quais, a incidência do IRRF, quando aplicável, a partir do momento em que os ganhos realizados na carteira excederem o capital integralizado do fundo, independentemente da efetiva distribuição.

Por outro lado, a MP 806 elimina a assimetria existente entre as regras de enquadramento do ponto de vista regulatório e tributário por meio da revogação da regra fiscal que impunha investimento mínimo de 67% em ações, bônus de subscrição e debêntures conversíveis.

Pontos de atenção

  • O relativo grau de subjetividade que pode permear da classificação do FIP como entidade de investimento pode trazer incertezas sobre o tratamento fiscal aplicável;
  • A sistemática de tributação ficta dos ganhos realizados na carteira dos FIP impede estratégias de diferimento mediante reinvestimento.

3. Reorganizações de fundos a partir de 1º.1.2018

Eventos de cisão, incorporação, fusão ou transformação de fundos de investimento passam a ser tratados como eventos sujeitos à incidência de IRRF a partir de 1º de janeiro de 2018. A base de cálculo do IRRF devido nesses eventos é a diferença positiva entre o valor patrimonial e o valor da cota no último evento sujeito à incidência de IRRF ou o custo de aquisição ajustado por amortizações anteriores.

Pontos de atenção

  • MP trouxe base legal para tributação das reorganizações de fundos de investimento (incluindo a transformação de fundos), o que inexistia até o momento;
  • Se aprovada a MP, não haverá mais possibilidade de realizar reorganizações sem impacto fiscal (com base no entendimento da RFB atualmente expresso no artigo 13 da IN nº 1.585/15), sendo altamente recomendável aos cotistas dos fundos e gestores que antecipem avaliação sobre potenciais reorganizações que eventualmente queiram fazer até o fim de 2017.
  • Eventual discussão sobre se essa tributação se aplicaria aos fundos que foram excluídos e definidos na MP 806 como sujeitos regras fiscais específicas.

4. Vigência e eficácia

A MP visa produzir efeitos partir de 1º de janeiro de 2018. Todavia, há de ressaltar que isto somente seria possível caso o texto da MP 806 seja convertido em lei até 31 de dezembro de 2017.