Em 27 de abril de 2018, a Justiça Federal concedeu parcialmente tutela de urgência para determinar que Microsoft Informática Ltda. facilite a gestão de dados por parte de seus usuários do sistema operacional Windows 10 através da disponibilização de ferramenta e interface operacional que permitam, de modo simples e direto, a não autorização do uso de dados pessoais e a customização de sua coleta pela empresa.
A decisão foi proferida na ação civil pública com pedido de tutela de urgência ajuizada pelo Ministério Público Federal ("Autor") em face de Microsoft Informática Ltda. ("Ré") e União Federal ("União") a fim de questionar a coleta de dados pessoais realizada pela Ré, pleiteando a sua condenação para adequar todas as suas licenças e/ou software do sistema operacional Windows 10.
Segundo o Autor, a Ré, por meio do referido sistema operacional, coleta dados pessoais de seus usuários sem o consentimento esclarecido destes, o que viola nitidamente o ordenamento jurídico pátrio, incluindo, mas não se limitando às regras do Marco Civil da Internet e os princípios constitucionais de privacidade e de proteção às relações de consumo.
O Autor pontua que a Política de Privacidade e os Termos de Uso do sistema operacional informam que ocorrerá a coleta de dados pessoais do usuário durante a utilização do sistema, contudo, não o faz de maneira clara, precisa e destacada, como é imposto pelo Marco Civil da Internet e Código de Defesa do Consumidor.
O Autor ainda menciona que a Ré dispõe de uma opção padrão, no momento de instalação, para a ativação da coleta massiva de dados. Tal opção seria aquela que poderia ser escolhida de modo mais simples pelo usuário, considerando que basta um clique para sua respectiva instalação, não havendo a necessidade de habilitar individualmente e customizar as preferências pessoais de modo a impossibilitar a coleta geral dos dados. Embora seja possível a desativação de tal coleta massiva por meio da referida ferramenta, tal opção se revelaria complexa e trabalhosa aos usuários que, em regra, não possuem a familiaridade para customizar os aplicativos utilizados.
De acordo com o Autor, a Ré deve (i) realizar instalações e atualizações do software do sistema Windows 10 para maiores facilidade e comodidade do usuário/consumidor, sem que tal sistema esteja programado para coletar seus dados pessoais; (ii) realizar a coleta de dados pessoais apenas com expressa e prévia autorização dos usuários/consumidores, incluindo alertas específicos acerca das consequências de tal autorização, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor e o Marco Civil da Internet; (iii) lançar atualizações imediatas a fim de que usuários que já sejam clientes do sistema operacional possam usufruir das medidas de proteção de dados mencionadas; (iv) dar amplo conhecimento das referidas obrigações aos consumidores.
Em relação à União, o Autor pleiteou a (i) elaboração de plano emergencial de proteção de dados e informações dos computadores que utilizem o sistema operacional Windows 10; (ii) apresentação das providências adotadas ou pretendidas em relação aos fatos relatados ao longo da ação em tela; e (iii) adoção de providências de fiscalização do cumprimento das ordens e obrigações expedidas pelo Juízo, com a possibilidade, inclusive, de firmar convênios especiais para o auxílio de tal fiscalização.
Por outro lado, a Ré alega que a coleta de tais informações é necessária para que haja o correto funcionamento do sistema e atualização de dados, gerenciamento do aplicativo, dentre outras atividades. Também alegou que a coleta e disponibilização de dados é efetivada com o consentimento de seus usuários.
Em relação à ferramenta que permite que o usuário customize e selecione quais dados o Windows 10 poderá coletar durante sua utilização, a Juíza Federal Cristiane Farias Rodrigues dos Santos entende que, por vezes, é mais fácil e rápido apenas concordar com os termos propostos (o que, neste caso, permitiria a coleta de dados pessoais), seguindo a via expressa, do que, efetivamente, compreender a forma de seleção específica dos dados.
Em sede de cognição sumária, a magistrada de primeiro grau afirma não ser possível a efetiva determinação da utilização do sistema operacional Windows 10 sem que haja a coleta de todos os dados pessoais do usuário ou se, de fato, tal coleta é essencial ao funcionamento do sistema, como alegado pela Ré. E, deste modo, pondera que tal dúvida enseja o requerimento de perícia técnica específica, a ser designada pelo Juízo.
Neste sentido, a togada entende que a concessão de tutela de urgência na forma requerida não é possível, no sentido de ordenar a completa readequação de todas as licenças e/ou software do sistema operacional Windows 10, de modo a garantir que este não mais colete informações e dados pessoais de seus usuários da forma realizada atualmente.
Contudo, a Juíza Federal considera plausível o pleito de determinar que a Ré adote procedimentos específicos de modo a permitir que o usuário do sistema operacional do Windows 10, em caso de não autorização de coleta e uso de seus dados pessoais, tenha acesso à ferramenta operacional para que consiga exercer tal opção de forma simples, seguindo a funcionalidade que o sistema possui na atualização para aqueles que autorizam expressamente a coleta de seus dados pessoais.
Assim, a Ré deverá informar os procedimentos a serem alterados para igualar operacionalmente as duas situações (de autorização ou não autorização da coleta de dados pessoais), do ponto de vista da facilidade por parte do usuário.
A tutela de urgência visa que a Ré se adeque às regras consumeristas, considerando que o Código de Defesa do Consumidor preconiza a transparência, o fácil acesso e a disponibilização de informações claras e precisas, o que não é vislumbrado nos documentos da Ré, tampouco no procedimento atual de customização da coleta de dados pessoais.
Em relação à União, a Juíza Federal entende pela necessidade de aguardar o desfecho da referida Ação de modo a ordenar que eventuais providências sejam tomadas por parte do ente federativo.
Deste modo, a magistrada deferiu parcialmente e em menor extensão o pleito de tutela de urgência realizado pelo Autor, no sentido de determinar que (i) a Ré adote procedimentos específicos com a finalidade de permitir que o usuário do sistema operacional Windows 10 tenha acesso à uma ferramenta operacional simples para exercer a sua opção de não autorização do uso de seus dados pessoais; (ii) seguindo a obrigação anterior, a Ré deverá informar os respectivos procedimentos alterados.
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